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quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Prazer de receber o advogado!


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Min. Ari Pargendler

O STJ está, desde o início de setembro, sob o comando de um gaúcho, com quase 35 anos de carreira na magistratura e que tem consigo boa parte dos valores inerentes aos juízes mais tradicionais: discrição, preocupação social e independência. Por isso, considera que o magistrado deve falar apenas nos autos e lamenta que as demandas de massa homogeneizaram os julgadores.

Ainda assim, Ari Pargendler é um juiz raro mesmo entre seus pares. Não reclama da exiguidade dos recursos financeiros que o Executivo repassa ao Judiciário para que este funcione melhor.

 
Ao contrário, acha que há dinheiro em demasia. Considera que juízes saem ganhando ao receber advogados, mas critica o que chama de mercado de advogados consagrados, criado por juízes que selecionam os profissionais que serão atendidos em seus gabinetes.


Pargendler advogou por três anos e foi procurador da República por outros quatro antes de entrar na magistratura. Nomeado para o STJ em 1995 pelo presidente FHC, foi avaliado pelo Anuário da Justiça como "legalista, mais favorável ao fisco do que ao contribuinte". Ele defende a simplificação da lei tributária e a redução dos recursos que prolongam a conclusão dos processos.


Em entrevistas concedidas às revistas Consultor Jurídico e IstoÉ Dinheiro, o ministro contou um pouco de sua história, falou sobre seus planos para administrar o mais importante tribunal superior do país e sentenciou: "o juiz tem que ser reservado e ter uma conduta irrepreensível na vida privada; o que se espera dele é o mesmo que se espera de um árbitro de futebol: que ele seja invisível".

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O presidente do STJ também critica o que chama de “terceirização da Justiça”, com sentenças elaboradas por auxiliares dos juízes e ministros.
Nessas matérias - sintetizadas pelo Espaço Vital - os textos são dos jornalistas Rodrigo Haidar e Denize Bacoccina.


A seguir, algumas de suas frases pinçadas das duas entrevistas mencionadas:

Lei dos Recursos Repetitivos
"Ela teve um efeito quase milagroso com relação às causas de Direito Público. No âmbito penal teve pouca repercussão. No Direito Privado também surtiu efeito, mas não com a grandeza que surtiu no Direito Público.
Essa lei abafou um pouco a rebeldia de determinados tribunais em relação à jurisprudência pacificada. Os tribunais foram percebendo que a rebeldia só iludia as pessoas e, com o juízo de retratação exigido pela Lei de Recursos Repetitivos, poderia inviabilizar sua atuação".

Bons juízes
"Certa vez eu ouvi de um desembargador do RS que o juiz aplicava o Direito e o desembargador fazia a Justiça. E que, para isso, importavam menos os livros e mais o bom senso. Eu achei um absurdo aquilo, porque para mim o conhecimento é a chave. O juiz é aquela pessoa que tem tirocínio, que enxerga na discussão o que realmente é importante e precisa ser decidido. Isso não é fácil. O juiz não se forma em faculdade, é uma pessoa que tem que procurar a sua formação lendo muito além do Direito.

Há muita gente boa na magistratura hoje, mas eles não estão focados completamente na magistratura. Estão focados no magistério, muitas vezes até no comércio do ensino. Como coordenador do CJF eu determinei que juízes poderiam lecionar em só uma instituição de ensino. A  Associação dos Juízes Federais do Brasil contestou a decisão e o STF a suspendeu. Então, há juízes que continuam lecionando, são donos de cursinhos. A limitação dessa prática é uma coisa que infelizmente eu não pude implementar na Justiça Federal".

Quinto constitucional
"A ideia é boa, mas a prática é ruim. Quando eu era mais novo, só eram escolhidos advogados destacados. E era uma grande honra ser extraído da carreira para chegar ao tribunal. Hoje, não sei se por desinteresse de bons candidatos, porque realmente o mercado da Advocacia é muito bom para profissionais competentes, os grandes advogados não se interessam. Interessa ao tribunal a presença do advogado para que ele traga sua experiência plena, do advogado que não tem vinculação com ninguém a não ser com o seu constituinte".

O juiz deve receber o advogado
"Eu sempre tive muito prazer de receber o advogado. No primeiro grau de jurisdição era uma maneira de eu me inteirar das notícias e dos boatos que corriam em Porto Alegre. O advogado chegava e contava uma história. Já aqui no STJ, é importante receber o advogado porque em cinco minutos ele me conta a história de um processo que está durando 15 anos. Eu economizo um bom tempo. Quando eu vou ler esse processo, já sei do que se trata".

Juízes que não recebem os advogados
"Isso é uma coisa muito peculiar do Brasil. Sou membro da Comissão Ibero-Americana de Ética Judicial. Todos os países ibero-americanos proíbem que o juiz tenha contato com o advogado. Quando, excepcionalmente, esse contato é necessário, eles impõem aos juízes a obrigação de comunicar à outra parte que recebeu o advogado do ex-adverso durante tanto tempo e que igual tempo lhe será concedido. É cultural.

Tenho uma prática que aprendi com juízes mais antigos: nunca fecho a porta do meu gabinete quando recebo advogados. Mas há juízes que têm o hábito de receber de porta fechada. Não há nenhum mal nisso. Mas o juiz precisa ser e parecer.

Com o enorme número de processos, os advogados só se sentem seguros se falarem com o juiz. Eu atendo a todos. Só que há juízes que só atendem advogados consagrados. Assim, pode estar se criando um mercado que só é acessível a alguns advogados. Isso não é saudável".

Excesso de recursos
"A lógica diria que um maior número de recursos melhoraria a decisão, porque é fruto de uma análise mais demorada, que fez a crítica das decisões anteriores. Pela lógica, a última decisão deveria ser a melhor. Mas nem sempre essa lógica deve ser observada.

E eu pergunto: como fica quando os tribunais têm que se valer de assessores? Se falta qualidade nesta decisão, por efeito de uma terceirização, o sistema deixa de funcionar. Então para que um recurso vai para um tribunal superior, se quem vai examinar esse recurso é um assessor?"


Justiça lenta
" Eu não sei como diminuir o número de processos na primeira instância. Na segunda fase da reforma do sistema judiciário, que não foi aprovada pelo Congresso, o STJ teria o poder de definir as causas que poderiam ser recusadas. Hoje isso não existe. Também não temos no STJ a súmula vinculante, como existe no STF. Precisaríamos mudar a Constituição. No caso dos processos repetitivos, existe uma orientação de que se observe a decisão tomada, mas não é obrigatório. Tudo isso contribui para a lentidão da Justiça.

A demora na tramitação dos processos custa bilhões à economia brasileira. Isso afeta a competitividade. Isso é um custo Brasil dos maiores que existem. Hoje já há uma evidência de que a economia tem uma íntima relação com o direito.  Qualquer investimento empresarial deve contar com um mínimo de segurança jurídica. Sem isso, fica difícil que o País tenha um bom desenvolvimento econômico".

Quantidade de processos
"No STJ temos 208 mil processos pendentes, mas estamos cada vez mais reduzindo o estoque. Este ano, até julho, 130 mil foram distribuídos aos ministros, e 134 mil foram julgados. Desde a instalação do STJ, em 1989, 3 milhões de processos já deram entrada, e 2,79 milhões foram julgados". 

Segurança jurídica no Brasil
"Nossa situação precisa melhorar muito. Casos realmente muito importantes demoram no STJ e demoram também no Supremo. A raiz disso está no número elevado de processos. Institucionalmente, podemos dizer que estamos na vanguarda. O grau da nossa efetividade judicial é pequeno, comparado com os recursos institucionais que nós temos".

Reforma tributária
"A reforma tributária, com mudança de tributos, é uma questão política. A minha experiência me diz que, quando houver esta reforma, num primeiro momento vai aumentar o número de ações, porque, quando temos uma legislação, já há jurisprudência consolidada. Então o Judiciário terá sua situação agravada.
Mas, com certeza, há espaço para uma simplificação da legislação tributária. O melhor livro de legislação tributária que já se escreveu no Brasil fala em manicômio judiciário. Podemos falar também em manicômio legislativo. As leis tributárias não são simples. Elas dão margem a inúmeros litígios. Evidentemente, se houvesse um maior apuro na elaboração dessas leis, nós teríamos um dinamismo tributário maior".

Direito alternativo
"Não existe Direito alternativo. O que pode existir é Justiça alternativa, que é sempre um desastre. Hoje já não tem força nenhuma. As leis são a nossa garantia. Um juiz tem que seguir a lei. Ela representa os valores da sociedade, e esses valores são ditados pelo Poder Legislativo".

 

Leia a íntegra das duas entrevistas
* Revista Consultor Jurídico
* Revista IstoÉ Dinheiro

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